Homenagem                                Agosto / 2006


 "O MAESTRO TOCAVA VIOLINO"

Por Clackson,  

Nos últimos meses o turfe experimentou uma perda em termos de pessoas que fazem desse período, senão o mais trágico, pelo menos o mais triste.

Em dezembro do ano passado a criação nacional perdia o seu maior símbolo, o criador Roberto Seabra (ver matéria neste site), em junho último perdemos uma referência em técnica e qualidade, o jockey Ivan Quintana, e não menos tristemente, neste início de agosto veio a notícia da morte de uma lenda. Em que pese que uma lenda não morre, mas a existência física não consegue acompanhar a longevidade eterna do mito. Infelizmente assim é a Natureza e não temos como revogar isso.  

A morte do freio Luiz Rigoni está para o turfe assim como a morte de Ayrton Sena esteve para o automobilismo. Eram dois seres supremos nas suas atividades, estão eternizados na história de seus esportes, como os maiores que já surgiram.  

Luiz Rigoni reinou soberano no turfe brasileiro no final da década de 40 até o início da década de 70, onde sem sombra de dúvida deu-se a “era de ouro” do turfe nacional.

Grandes cavalos, aliados à grande jockeys faziam verdadeiros espetáculos, dignos de arrastar multidões aos hipódromos, fosse o da Gávea, fosse o de Cidade Jardim.

Paralelamente essa época de ouro do turfe, o Brasil iniciava seu período de industrialização, a Petrobrás estava sendo criada, a indústria automobilística engatinhava no país, Brasília estava nos planos, e o turfe, como a contribuir nesse sentimento de que tudo vai dar certo, dava com seus cavalos e jockeys, a sua participação. Rigoni mais do que ninguém foi o embaixador do turfe nessa fase de Brasil Grande.  

Entre os animais, Gualicho, Tirolesa, Garbosa Bruleur, Qüiproquó, Adil, Farwell, Emerson, Gaudeamus, El Aragonés, Narvik, Joiosa,Timão, Dulce, Escorial, Fort Napoleon, Vândalo e tantos outros eram a auto afirmação nacional em quatro patas.  

Pelo lado dos jockeys além do “maestro” Luiz Rigoni, Pierre Vaz, Oswaldo Ulloa, Juan Marchant, Dendico Garcia, Luiz Gonzalez, Emigdio Castillo, José Alves, Francisco Irigoyen, Virgílio Pinheiro Filho, Lodegar Bueno Gonçaçves, Omário Reichel, Candido Moreno, Armando Rosa, Luiz Diaz, Olavo Rosa, Domingos Ferreira, José Nascimento e outros, enfrentavam nos Grandes Prêmios internacionais ninguém menos que a lenda Irineo Leguisamo, Salvador di Tomaso, Juan Pedro Artigas, Elias Antunes, todos estes ícones na Argentina.  

Em outras palavras, a nata nacional enfrentava a nata platina.  

Nesse universo entra triunfalmente o maior freio brasileiro de todos os tempos, Luiz Rigoni, que sintetizou tão bem esse período tão áureo do turfe brasileiro.  

Apropriadamente apelidado de “O homem do violino”, dado pela característica do regime de freio permitir o uso de uma das mãos nas rédeas, e a outra no chicote, Luiz Rigoni ao movimentar seu chicote, próximo as rédeas, que formavam um arco,  a analogia era imediata do instrumento e seu “músico”.  

Nesse momento mágico do “violino”, o público turfista ecoava uma ordem unida do “Dá-lhe Rigoni”, e essa era a senha para eletrizar à corrida e o “músico” afinava bem o instrumento e levantava o páreo para delírio do público.

Os hipódromos eram palcos a céu aberto para esse “maestro”!!    

Rigoni - "O verdadeiro Dono da Raia "

Vencedor de várias estatísticas na Gávea, Luiz Rigoni apesar das graves quedas que teve durante sua carreira, voltava sempre para alcançar o líder e tomar-lhe o título da Estatística.

O bridão Emigdio Castillo era seu mais direto concorrente e uma disputada mais do acirrada eletrizava os turfistas cariocas.  

Em São Paulo, Rigoni também deixava sua marca ao vencer por duas vezes seguidas o Grande Prêmio São Paulo, em 48 com Garbosa Bruleur, e em 49 com Saravan.    

Rigoni - Com Garbosa Bruleur

Em 1.954, montando El Aragonés, Luiz Rigoni venceria seu primeiro Grande Prêmio Brasil de forma assombrosa e lembrada até hoje como uma das mais épicas vitórias de um jockey naquele páreo. Ficou sempre em último lugar e na altura dos 700 metros finais passou para penúltimo onde iniciou uma atropelada que entraria para a história do Grande Prêmio Brasil. No disco livrou meio corpo de vantagem para Joiosa, dirigida por Emigdio Castillo.

Notar a multidão que testemunhou esse feito histórico.

Dizem até que a estátua do Cristo Redentor voltou-se para a Gávea só para ver essa chegada do Rigoni...

Rigoni - Com El Aragonés (GP. Brasil)

Na década de 60, Luiz Rigoni viria a ser um dos jockeys brasileiros que assombrou o hipódromo de San Isidro, por ocasião dos páreos comemorativos do Sesquicentenário da Independência da Argentina.

Iniciando a triunfal série de vitórias, o mítico freio Antonio Bolino, montando a égua Elizabeth, do Haras Ipiranga, ganhava o primeiro páreo dedicado às comemorações.

Na seqüência, o “homem o violino”, montando Major´s Dilema, do Sr. Alberto Marchione, criado pelo Haras Bela Esperança, numa direção antológica, fez uma exibição de gala para o público portenho, estes tão acostumados as “ serenatas” de Irineo Leguisamo, e assim levantava a segunda vitória brasileira.

No dia seguinte, Escorial, dos irmãos Seabra, com “ jockey invisível” Francisco Irigoyen infligiam aos vizinhos platinos a mais estrondosa vitória brasileira até então, na mais importante data nacional da Argentina. Farwell, com o freio Lodegar Bueno de Gonçalves, e de propriedade dos irmãos Almeida Prado, faria segundo para a glória maior do turfe brasileiro.

A “Orquestra Turfônica Brasileira”  com Antonio Bolino, o “ maestro” Luiz Rigoni e Francisco Irigoyen e o L.B. Gonçalves exibiram aos argentinos toda a classe e categoria do jockey brasileiro. Um feito memorável.

No início da década de 70, Luiz Rigoni venceria por duas vezes consecutivas o Grande Prêmio Brasil, sendo em 70 com Viziane e 71 com Terminal, sendo esta a última vez que o GP Brasil era disputado nos 3.000 metros.

Como tudo que está relacionado a Luiz Rigoni é incomum, nessas duas ocasiões ele levantaria também os páreos da milha montando a lenda Quartier Latin.

Ganhar por duas vezes seguidas a milha e o GP Brasil é um feito que não será repetido tão cedo no turfe brasileiro.  

Em 1970 ele ainda venceria, em SP, o páreo da milha internacional montando também Quartier Latin.  

Viziane

Quartier Latin

Sua categoria e fama foram tão grandes que foi rodado um filme curta metragem, cuja direção foi de Paulo Sergio de Almeida, com o obrigatório título de “Dá-lhe Rigoni”, onde a vida profissional do maior freio brasileiro de todos os tempos foi mostrada.

Após a sua aposentadoria nas pistas, o “maestro” ensaiou um retorno às pistas, no início dos anos 80, em Cidade Jardim. O autor destas linhas foi testemunha da sua primeira montaria nesse período. Luiz Rigoni montou a égua Cita, e ao adentrar à raia de Cidade Jardim para a disputa do páreo, uma inesquecível reverência do público foi feita ao grande mestre.

Na reunião seguinte, Luiz Rigoni levantaria três páreos, e isso numa época em que Albenzio Barroso, Ivan Quintana, Antonio Bolino, João Manoel Amorim, Eduardo Le Mener, Jorge Garcia, Edson Amorim, Roberto Penachio, eram ícones no turfe paulista.

O “maestro” estava à vontade com a ”meninada”.  

Rigoni - Padoque (SP)

Uma queda nos matinais fez com que Luiz Rigoni reconsiderasse seu retorno às pistas e decidiu aposentar-se de vez, como jockey, mas não do turfe, pois passou a ser colunista no jornal “O Estado de São Paulo”. Em breve este site publicará um de seus artigos.

Nestas linhas pretendeu-se em rápidas palavras mostrar o que representou Luiz Rigoni para o turfe brasileiro. Sinceramente não há como conseguir esse objetivo. Luiz Rigoni foi e será sempre um mito, e mitos não se traduzem em palavras.

Muitos leitores poderão argumentar que outros jockeys também ganharam GP´s Brasil, GP´s São Paulo.

É verdade.

Argumentarão também que além dos GP´s acima ganharam GP´s na Argentina e Estatísticas.

É verdade também, mas a foto abaixo vai mostrar que esses outros jockeys  jamais fariam o que Luiz Rigoni fazia.    

O jockey assustado na foto não é ninguém menos que o “Feiticeiro” Albenzio Barroso, outro monstro sagrado das rédeas.  

Luiz Rigoni - Técnica genial num feito Histórico

Luiz Rigoni não fazia o cavalo correr, ele fazia o cavalo voar !!!

Luiz Rigoni 

Descanse em paz “Grande Mestre Luiz Rigoni”

Mais sobre Rigoni:

No arquivo do site encontra-se o artigo - Gigantes das Rédeas - publicado em 2005 em homenagem à Dendico Garcia e Luiz Rigoni.

Ver também a matéria “Uma defesa solitária do regime de freio”.

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